de Finibus Bonorum et Malorum



Reclamações recentes

Empatia, Amizade e Bom Senso

couple of hands

O ano de 2009 foi um ano bem complicado na minha vida. Muita gente sabe disso.

Só que quase ninguém conhece a história de tudo que eu passei naquele ano.

Contexto

Acho importante listar algumas coisas que ajudaram 2009 a se tornar um ano tão horrível.

De tudo que aconteceu em 2008, a maior parte do peso vem do mês de Setembro. Houve várias mortes na família (três tios morreram naquele mês). Minha namorada (à época) foi para o exterior, de onde só voltaria muitos anos depois; essa separação deu início a um processo profundamente doloroso que se arrastou por 15 meses.

E naquele mês meu pai morreu.

Naquele mês eu também defendi meu Mestrado; e segui em frente, entrando no Doutorado. Mas, de início, não tinha bolsa. Eu sobrevivi graças à minha orientadora e a aulas particulares que eu consegui, graças à indicação de um amigo. Ainda assim, depois da defesa eu saí do apartamento onde morava, e passei uns meses com minha mãe. Para descansar, lamber as feridas, e tentar me reerguer.

Não é essa a história que eu quero contar; mas é bom oferecer um pouco de contexto para o que vem a seguir.

Sobrevivendo, mas sem viver

Pessoalmente, Setembro de 2008 foi o início de um “inferno astral” que só terminaria no início de 2010. Eu sempre fui uma pessoa meio difícil, mas aquela situação me puxou para além do limite. Eu me tornei agressivo, rude, mal-humorado. Difícil de conviver.

A maneira como cada um lida com uma perda desse tamanho é algo bastante pessoal, e depende muito da personalidade da pessoa. É algo meio imprevisível e, ironicamente, pode ser o início de uma jornada de autoconhecimento.

Mas posso dizer, com conhecimento de causa, que não é nada fácil lidar com a perda de um pai, a distância da pessoa amada, a dificuldade financeira de não ter bolsa, e não ter nem mesmo onde morar, numa vida nômade, muitas vezes dormindo em umas cadeiras que eu colocava juntas na minha sala.

E admito que, para as pessoas que se encontravam à minha volta, aquela provavelmente foi uma situação muito complicada. Amigues e colegues reagiram cada um à sua maneira.

Algumes simplesmente aceitaram o fato, esperando que eventualmente eu melhorasse.

Outres vieram conversar comigo, buscando entender o que eu estava passando.

Houve pessoas, entretanto, que não reagiram bem.

Abandono e desapontamento

Um grupo particular de pessoas foi o que mais me magoou. Essas pessoas, um grupo que eu considerava como amigues muito próximos, e com quem eu contaria para tudo, falhou em demonstrar qualquer tipo de empatia ou de paciência. Eu fui simplesmente sendo afastado; encontros e eventos eram planejados sem eu saber. Eu não era incluído em alguns assuntos. Conversas morriam assim que eu me aproximava.

Foi uma situação muito difícil, para todes. Mas para alguém que tinha (tem?) dificuldades em perceber ou lidar com emoções, foi uma completa catástrofe. Um dia eu finalmente percebi que havia algo de errado quando percebi uma coisa e comentei no twitter. E recebi a resposta (que foi apagada depois): “não, vc não foi convidado mesmo”.

Aquilo acabou comigo. Fiquei com raiva, fiquei triste, fiquei revoltado. Mas, acima de tudo, fiquei magoado. Eu estava passando pelo período mais difícil da minha vida e esperava que se houvesse algo de errado poderia contar com amigues para se aproximarem e buscar, no mínimo, me entender.

Não foi isso que aconteceu. Se houve tentativas de aproximação, eu não percebi. Só quando já era tarde demais alguém me perguntou “tá tudo bem? vc tem sido meio agressivo”.

Mas, como eu disse, era tarde demais. O dano estava feito. Pensamentos bem sombrios rondaram a minha mente nessa época.

Eventualmente, o “tranco” foi suficiente para eu perceber o que estava acontecendo – e consegui “reatar” as relações com esse pessoal. Me desculpei, e tentei reajustar o meu comportamento.

Não me lembro de ter recebido um único pedido de desculpas.

De qualquer maneira, segui em frente.

Perdoar sempre, esquecer nunca

Depois daquilo a vida seguiu em frente. Comecei a fazer terapia (que durou por muitos anos). Consegui minha bolsa de doutorado, consegui vaga em um apartamento no CRUSP (e eventualmente saí de lá), reconstruí minha vida.

Minha “música tema” era Coming Back to Life, do Pink Floyd. De fato, era por isso mesmo que eu estava passando. Uma parte de mim morreu no biênio 2008-2009; eu estava aos poucos me reconstruindo, voltando à vida.

Morei no exterior duas vezes. Concluí o doutorado. Trabalhei como professor. Achei o amor novamente. Me casei. Dez anos se passaram.

Mas eu nunca esqueci.

Aprendizado

Aprendi muito com tudo que passei nos últimos 14 anos. Uma das principais coisas que aprendi foi que a Empatia é como um músculo: ela precisa ser exercitada.

Ela não é uma característica intrínseca, com a qual se nasce e pronto. É um esforço consciente de sempre tentar se colocar na situação do outro, de procurar entender o que leva a pessoa a fazer o que faz.

Em tempo: é muito bom salientar que certas pessoas não merecem empatia. Mas felizmente essas pessoas são exceções e não a regra. Tipo o velho escroto que morava na Virgínia.

De qualquer forma, a Empatia é especialmente importante quando se trata de alguém próximo. É o mínimo que devemos fazer, quando interagimos com pessoas próximas: exercitar esse “músculo” e procurar entender o que realmente está sendo dito.

A mensagem é mais importante que a forma, e mesmo que a maneira como alguém se comunica possa ser desagradável, se nos importamos com essa pessoa é necessário tentar enxergar além das palavras, e ler nas entrelinhas.

O que é dito pode até ser controverso, errado ou até mesmo interpretado como imoral. E, normalmente, essa interpretação é a correta. Se é uma thread no twitter, um comentário aleatório no facebook, ou qualquer interação com uma pessoa qualquer, geralmente a primeira impressão é a mais acertada, e a ausência de relação com a pessoa em particular nos excusa uma resposta direta.

Mas quando é alguém próximo, é no mínimo uma demonstração dessa proximidade buscar compreender o que está realmente sendo dito.

Gatilho e reação

Eu não pretendia falar tão abertamente de tudo isso neste blog, nunca. Há uns dois anos mais ou menos eu vinha ruminando tudo isso, tentando colocar em um formato que fosse mais… eufemístico, por falta de termo melhor.

Mas ontem eu presenciei a mesma coisa, com praticamente o mesmo grupo de pessoas.

E isso ativou um gatilho em mim. De repente eu percebi que isso nunca mudou. É um grupo razoavelmente heterogêneo, que inclui pessoas passando por uma transição que não é nada fácil e que recentemente eu vi comparada no twitter a “mergulhar no abismo apenas com a esperança de se encontrar” – algo que eu acho maravilhoso e inspirador.

Mas me chamou a atenção algo que eu percebi só hoje. Em 2009 eu fui chamado de “killjoy da salinha”. Acho que faz sentido; só coisas positivas são aceitas. Problemas pessoais ou conversas sérias devem ficar de fora.

SEMPRE foi um grupo de colegues. NUNCA um grupo de amigues. Isso, infelizmente, não mudou em 13 anos.

Conclusão? Não.

Presenciar alguém que está passando por uma situação extremamente difícil e traumática ser escorraçado me deixou muito abalado.

E isso é muito, MUITO triste.


Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *