de Finibus Bonorum et Malorum



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Evoluir é deixar o passado para trás

Popped bubble

Recentemente eu tenho pensado muito em um ex-colega de faculdade. Na época, aqueles de nós que tinham uma consciência de classe menos desenvolvida ríamos dele. Fazíamos chacota, por causa de uma certa frase que ele disse uma vez. Não lembro mais quais as palavras exatas que ele usou, mas o sentido da frase é o seguinte:

Quem não é de esquerda é alienado, e isso não é questão de opinião.

— Leonardo Mota

O passado do blog

Hoje em dia eu falo, em tom de brincadeira, que sou um “reaça recuperado”. É uma hipérbole, claro, porque eu ainda sustento que nunca fui, de fato, um “reaça” (entenda-se por “reaça” o imbecil de extrema-direita). Mas eu já fui pobre de direita.

Permanece o fato, portanto, que muitas vezes no passado eu sustentei opiniões que seriam consideradas “de direita”. Nem é necessário voltar muito nas postagens deste mesmo blog para constatar isso (para minha vergonha).

Mas, por mais que eu me envergonhe das idiotices que um dia eu já escrevi aqui, eu não tenho a menor intenção de apagar nada. Falando de uma forma menos obscura, eu apagaria qualquer coisa que passasse da burrice para a imoralidade. Mas, que eu saiba, eu nunca escrevi nada do tipo aqui. Já escrevi idiotices enormes, como apoiar o golpe de 2016, por exemplo. Mas nunca algo imoral.

O motivo pelo qual eu não quero apagar esses posts antigos é que eles são uma lembrança. Me ajudam a valorizar o processo pelo qual eu passei e que me fez rever muitos pontos de vista.

O impeachment e a decadência

Ironicamente, eu diria que foi o Golpe de 2016 que iniciou esse processo. Antes disso eu já sentia dificuldade em encontrar explicações para criticar os governos do PT (ginástica mental para defender o indefensável, olhando em retrospecto). Isso era uma semente que finalmente criou raízes quando o Temer fundiu o Ministério de Ciência e Tecnologia com o das Comunicações. E, de fato, dá pra argumentar que tudo começou até mesmo um pouco antes, quando um certo parasita homenageou um torturador.

Dali pra frente, o país como um todo entrou num processo de colapso total que foi iniciado pelo Eduardo Cunha quando resolveu soltar as pautas-bomba pra sabotar a Dilma. Eu me considero uma pessoa de muita sorte, por ter conseguido tocar a vida depois que o Temer assumiu. Comecei a entender reivindicações e protestos que eu ouvia já há muito tempo, e que finalmente começaram a ressoar na minha mente e começaram a fazer sentido. Busquei me informar melhor e, inevitavelmente, minha consciência de classe finalmente começou a florescer.

Morar na Alemanha e ver o Brasil de fora ajudou bastante também. Essa mudança de perspectiva finalmente me abriu os olhos e eu me vi concordando muito mais frequentemente com opiniões de esquerda do que com as de direita.

Novos olhos, mesmas pessoas

Nesse processo, comecei a ver as pessoas com outros olhos. Gente com quem eu sempre concordara de repente começou a soar retrógrada e tosca. Gente de quem eu havia me afastado de repente começou a fazer muito mais sentido.

Nesse processo, me reaproximei de pessoas de quem eu me afastara, justamente por compartilharem opiniões de esquerda. Des-bloqueei várias pessoas, e me reaproximei de muita gente boa.

Ao retornar ao Brasil, no meio do calor das eleições de 2018, mergulhei no movimento da USP pela democracia. Me senti aliviado ao finalmente me abrir (e ser acolhido) em uma assembleia em que relatei a minha jornada de “eleitor do PSDB” a “esquerdopata”.

Houveram, também, decepções. Gente que eu conhecia e gostava mostrando que ainda não entendia o que estava (está!!!) em jogo. Gente que dizia pensar no “cidadão médio” (na verdade esse sujeito em particular usou uma expressão xenofóbica), e que por isso se dizia “imparcial”. Como se houvesse imparcialidade na escolha entre fascismo e democracia. E, mesmo depois que o Bucéfalo foi eleito e mostrou a que veio, essas pessoas continuaram a sustentar essas opiniões toscas (ou piores!).

Estou falando, é claro, do antipetismo.

Essa mácula na vida pública brasileira vai demorar a se fechar (se chegar a tanto). Infelizmente, a campanha que houve contra os governos do PT foi muito bem-sucedida. Para certas pessoas vale tudo para impedir a volta do PT. O que é no mínimo, trágico, porque a vida de todas essas pessoas melhorou entre 2002 e 2016.

Estourando a bolha

Isso me deu um estalo, quase que literalmente como uma bolha estourando. Comecei a me aproximar das pessoas certas. Especialmente daquelas que eu quase não enxergava por causa de toda a dinâmica atual de “redes sociais”. Hoje em dia as vidas as pessoas são praticamente dominadas pelos “algoritmos”. Isso cria câmaras de ressonância onde somente opiniões parecidas entram, desestimulando o pensamento crítico. A evolução emerge da interação entre entes divergentes, contudo isso não acontece em redes sociais. Eu já tinha percebido isso subconscientemente quando decidi apagar meu Facebook.

Infelizmente (ou talvez nem tanto), isso não sai de graça. Como eu já mencionei acima, algumas pessoas de quem eu era próximo aos poucos foram deixando suas máscaras caírem. Meu objetivo não é me fechar em outra bolha, mas de algumas dessas pessoas eu achei mais viável simplesmente me afastar.

De início foi um processo lento. Busquei conversar, tentar entender, ter empatia. Mas conforme o tempo foi passando ao longo dos últimos quatro anos, ficou mais difícil. Principalmente para quem tem condições de se informar decentemente, todas as justificativas para apoiar o Bucéfalo foram demolidas. Não restou nada, a não ser a bile, o rancor, o recalque e o ódio.

Busquei fazer a minha parte, e até certo ponto, consegui. O “vira-voto” não é de hoje, é de quatro anos atrás. Muita conversa, conscientização, argumentação, todas as táticas não para convencer a “mudar de lado”, mas a ver a realidade. E a realidade fala por si só.

Eliminando as partes podres

Ultimamente, meu foco é outro. “Eliminar” talvez não seja a palavra certa. Eu prefiro dizer que tenho filtrado as pessoas da minha convivência. Não tenho a menor intenção de interagir com quem ainda apoia esse sujeito a esta altura. Não é fácil, devo dizer. Vivo com medo de descobrir alguém nessa situação. Existem alguns casos em que eu poderia considerar uma tolerância maior, mas minha confiança nessas pessoas é muito grande. Sinceramente não sei qual seria minha reação ao descobrir o voto de certas pessoas mais próximas. Mas eu tenho esperança.

O caso mais recente é o que me levou a escrever este texto. Duas pessoas que me decepcionaram, mas não me surpreenderam. No Ensino Médio eu estudei em um colégio de elite, graças a uma bolsa de estudos. Nesse lugar, obviamente, praticamente todos eram “filho de rico”. Não foi realmente nenhuma surpresa quando duas dessas pessoas vieram num post meu do Instagram postando a hashtag do Cretino. Com relação às outras, talvez o caso seja diferente, mas é difícil discernir. Não saio perguntando em quem as pessoas vão votar (em parte por causa do medo de me decepcionar).

É realmente deprimente que no Brasil de 2022 uma coisa dessas tenha qualquer chance de ganhar a eleição.


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